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Reflexões sobre A Peste, obra de Albert Camus. Um paralelo entre a ficção e a realidade na pandemia

Atualizado: 23 de jul. de 2021



Pedro Mancuso - Engenheiro Industrial Modalidade Química. Mestre em Saúde Pública e Doutor em Saúde Pública. Professor Doutor do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, membro do Conselho Administrativo do Centro de Apoio à Faculdade de Saúde Pública da USP (Ceap) e Coordenador do Centro de Referência em Segurança da Água, Cersa (Ceap).



Pertencente a uma família operária, Albert Camus (1913-1960) cresceu na Argélia, onde estudou filosofia.


Filho de um francês e de uma descendente de espanhóis, o escritor perdeu o pai na Batalha de Marne, em 1914, durante a Primeira Guerra Mundial. Marcado pela guerra, pela fome e pela miséria, filiou-se na França ao Partido Comunista (1934-1935) e em 1940 aderiu ao movimento da Resistência contra a ocupação alemã.

Em 1942, em plena Guerra Mundial, Albert Camus publica seu mais importante romance, “O Estrangeiro”.


O romance narra a história de um homem vidente que comete um crime quase inconsciente e é julgado por esse ato.

Ao lado de Jean-Paul Sartre, foi um dos principais representantes do existencialismo francês, influenciando de modo decisivo a visão de mundo da geração de intelectuais rebeldes da época de pós-guerra. Em 1957, Camus foi agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura.


Em 1947 Camus publica “A Peste”, uma narrativa simbólica da luta de um médico envolvido nos esforços para conter a epidemia.

Camus destaca a mudança na vida da cidade de Orã, na Argélia, depois que ela foi atingida pela peste transmitida pelos ratos, e que dizimou grande parte da população.

Em 1949 Albert Camus visita o Brasil e é recebido pelo adido cultural francês e pelo escritor e intelectual Oswald de Andrade.


A Peste não é o melhor livro de Camus. O Estrangeiro e A Queda são suas obras-primas, mas é o maior livro da literatura a ter uma epidemia como tema.

Sua contracapa registra que “esse romance destaca a mudança na vida da cidade de Orã depois que ela é atingida por uma terrível peste, transmitida por ratos, que dizima sua população. É inegável a dimensão política deste livro, um dos mais lidos do pós-guerra, uma vez que a cidade assolada pela epidemia lembra a ocupação nazista na França durantes a Segunda Guerra Mundial.


A Peste é uma obra de resistência em todos os sentidos da palavra. Narrado do ponto de vista de um médico envolvido nos esforços para conter a doença, o texto de Albert Camus ressalta a solidariedade, a solidão, a morte e os outros temas fundamentais para a compreensão dos dilemas do homem moderno. ”


Considero que sua leitura continua atual e agora não mais em Orã, mas globalmente, se considerarmos nosso planeta como um globo e não como um plano.

O impressionante da epidemia é que da mesma forma que surge, ela desaparece sem que os sanitaristas da época pudessem entender como isso ocorreu.


Até ouso a interpretar os crescimentos epidemiológicos das pestes à luz de meu modesto entendimento epidemiológico, que apresento nas linhas que seguem, e que foram desenvolvidas com base em Samuel Pessoa em recente publicação na Folha de São Paulo, 02/08/2020.


De acordo com o raciocínio epidemiológico, uma epidemia para de crescer quando cada pessoa com o vírus transmite somente para uma pessoa (ou menos).

Isso é razoável se cada pessoa portadora do vírus, tomando os cuidados que estão sendo preconizados –uso contínuo de máscara e distanciamento social- transmita o vírus para N pessoas, considerando que todas que encontre sejam suscetíveis à contaminação.

Mas supondo, que já haja uma proporção (ɒ) da população imunizada, a população suscetível de ser contaminada é (1-ɒ). Nessas condições, agora ela será capaz de infectar uma população de N(1-ɒ).


Quando uma pessoa infecta em média uma pessoa, a pandemia para de crescer. E se infectar menos que uma pessoa, começa a declinar. Assim, quando N(1-ɒ), para a média da população for igual, ou menor a 1, a epidemia para de crescer e recua: é a chamada “imunidade de rebanho”.

Em termos de equação a imunidade de rebanho chega quando N(1-ɒ)=1, onde ɒ=proporção da população infectada e imunizada. O limiar da imunidade de rebanho ocorre quando ɒ=1-(1/N).


Mas o Brasil não é Orã. Pela extensão do país, tem-se observado que o N da Covid 19 é 2,5. Se isso for verdadeiro, o limiar da “imunidade de rebanho” é atendido para ɒ=1-(1/2,5) o que dá 0,6. Ou seja 60% (70% se adotado um coeficiente de segurança), supondo que a transmissão de cada portador seja igual ao longo da evolução da epidemia e que esse patamar somente é atingido, por força de campanhas de vacinas e não naturalmente.

Segundo o The New York Times Book Review, trata-se de “obra de tal importância que rejeitá-la seria o mesmo que blasfemar contra a alma humana”.


Li A Peste pela primeira vez em 1986, por indicação de meu mestre Prof. Dr. Edmundo Juarez, que despertou em mim o interesse pelo conhecimento epidemiológico.



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