José Everaldo Vanzo - Engenheiro CIvil e Sanitarista pela Escola de Engenharia de São Carlos
Atuou como gerente da Superintendência Regional de Franca, Diretoria de Sistemas Regionais e Diretoria Técnica da Sabesp (1977-2007, diretor presidente da FABHAT- 2008-2009, diretor presidente da Águas do Amazonas - 2009-2010 e Pró-reitor administrativo e financeiro da UNIFEB 92016-2020
Estamos entrando na pior fase de um processo de estiagem, que vem se agravando há cerca de quatro anos. Órgãos especializados como a ANA,SNM e CEMADEN alertam que os Estados de São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Goiás terão tempos difíceis neste ano de 2021 e classificam o período de severo em decorrência de uma escassez hídrica nunca vista, até então.
Sem chuvas e com demandas de águas doces para agricultura, geração de energia e abastecimento das cidades, o cenário geral é péssimo e pior fica porque vem se somar aos efeitos danosos da pandemia que grassa célere por falta de gestão competente.
Acontecerá o mesmo com esta longa estiagem classificada como a mais severa dos últimos 111 anos?
Quem dará a resposta é a qualidade da Gestão Estratégica que será formada. Se for igual à da pandemia, será um novo desastre econômico, social, político e de desenvolvimento humano e ambiental.
Sem água a agricultura destes cinco Estados ficará fortemente prejudicada, pois é sabido, grosso modo, que entre 60% a 70 % da água doce de uma Bacia Hidrográfica é utilizada para fins agrícolas, 20% para suas indústrias e 10% para o abastecimento das cidades na forma de água potável e afastamento e transporte dos dejetos pelas redes coletoras de esgotos.
Estes cinco Estados respondem por 50% do PIB brasileiro e para sustentar a geração de tanta riqueza o principal insumo é a água doce, que está escassa como nunca houve antes. Sem ela, a geração de energia hidrelétrica fica prejudicada e as plantações extensivas de grãos fica abalada.
Em breve síntese: não haverá disponibilidade hídrica para tanta demanda porque o ciclo hidrológico está alterado.
E por que se alterou tão drasticamente?
Alguns especialistas em Meteorologia atribuem esta crise à conjunção de dois fenômenos naturais. A La Niña e a Oscilação Antártica (AO). Outros ponderam que isto não explica tudo, pois eles já estiveram juntos em outros momentos e o resultado não foi tão severo como agora, e apontam para as mudanças climáticas em curso em todo o planeta, provocadas pela emissão excessiva e descontrolada de gás carbônico.
Regionalmente, cabe destacar efeito negativo do desmatamento da floresta amazônica, incentivado pela grilagem de terras e roubo de madeira, que agrava o que já está ruim.
E sem disponibilidade hídrica não é só o desenvolvimento econômico e social que é afetado, são, também, os ecossistemas e a qualidade de vida das populações.
É claro que o habitante destes cinco Estados está dentro de uma grande e histórica crise de escassez de água doce e isso pode sensibilizar os governantes e as boas cabeças dos outros dois poderes a buscarem soluções definitivas e adequadas. Os bons governos existem para isso, enfrentar e vencer os problemas difíceis e complexos.
São Paulo, que responde por 35% do PIB e tem, em condições normais, apenas 6% da água doce do Brasil, agravado continuadamente pelo fato de ter apenas 12% do seu território de matas nativas, contendo 21% da população brasileira, será, entre os cinco, o mais afetado.
Soou a hora de se fazer uma grande mesa composta pelas melhores cabeças em Gestão de Recursos Hídricos, Saneamento, Ambiente, Uso e ocupação do solo urbano-rural, Desenvolvimento Econômico-Social, P&D, Papel do Estado e Governança, estabelecendo Política Pública de Integração das demais Políticas envolvidas nessa crise.
Dessa mesa de notáveis sairão, também, as providências mitigadoras de curto prazo como o acionamento de usinas térmicas, expansão das eólicas e solares, restrição da navegação fluvial, incentivo à irrigação de gotejamento e outras, de modo a recuperar os níveis seguros dos reservatórios das hidrelétricas, carro chefe da matriz energética do país.
Da minha janela enxergo oportunidades para: o reuso (planejado ou não) dos esgotos, novos reservatórios para uso múltiplo, planejamento Integrado das macro metrópoles com a garantia de disponibilidade hídrica, importância dos Comitês das Bacias Hidrográficas e seus braços executivos na forma de Agências de Bacias.
Mas não só, cidades feitas para as pessoas, com oportunidades locais de trabalho e crescimento profissional, cultural, artístico, ético, político (no sentido grego da palavra) e tudo que possa assegurar o desenvolvimento sustentado e a qualidade da vida humana, da flora e fauna.
Com raras exceções , a maioria dos estados e municípios não contam com um plano de Contingência para enfrentar eventos climáticos extremos. As estratégias de enfrentamento de grande secas só começam a ser discutidas, definidas e implementadas, depois de configurada a gravidade da situação . Muitas vezes, chamam isso de Plano de Contingência. Melhor seria, defini-las como Plano de Emergência.
Este artigo nós faz refletir o quanto não aprendemos com nossas experiências. O Brasil convive com épocas de seca extrema há décadas. A maior delas ocorreu no período de 1877 a 1879 que matou milhares de brasileiros de fome,especialmente no NE e foi responsável pela intensa migração de nordestinos para outras regiões do país. Como a cigarra da fábula, continuamos a cantar e só nos damos conta quando a torneira está prestes a secar. Outros países como Israel , onde a água é escassa, desenvolveram tecnologias para usar a água com sabedoria. As oportunidades sobre as quais o autor discorre são muitas, mas será necessário vontade para em prática.
Passam os anos e essa "mesa" nunca é composta. Os grandes desafios da gestão e governança dos setores de saneamento, saúde ambiental e recursos recursos hidricos continua a ser discutidos nas obscuridades dos diversos gabinetes governamentais. Sem a devida integração sem a participação da sociedade.